CONSELHO DE SECRETARIAS MUNICIPAIS DE
SAÚDE
DO ESTADO DO PARÁ – COSEMS/PA
CNPJ:
00.636.190/0001-38
PARECER
SOBRE A LEI FEDERAL 12.994/2014, QUE INSTITUIU O PISO NACIONAL DOS AGENTES
COMUNITÁRIOS DE SAÚDE E DOS AGENTES DE COMBATE ÀS ENDEMIAS.
A
lei federal de n. 12.994, de 17 de junho de 2014, alterou alguns artigos da lei
federal 11.350, de 5 de outubro de 2006, com a finalidade de instituir piso
salarial profissional nacional e diretrizes para os planos de carreira dos
Agentes Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias.
Em
seu artigo 1º, a citada lei estabelece um piso salarial nacional. Vejamos:
“Art. 9o-A. O piso salarial profissional nacional é o valor abaixo do qual a União,
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento
inicial das Carreiras de Agente Comunitário de Saúde e de Agente de Combate às
Endemias para a jornada de 40 (quarenta) horas semanais.
§ 1o O piso salarial profissional nacional dos Agentes
Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias é fixado no valor de
R$ 1.014,00 (mil e quatorze reais) mensais.
§ 2o A jornada de trabalho de 40
(quarenta) horas exigida para garantia do piso salarial previsto nesta Lei
deverá ser integralmente dedicada a ações e serviços de promoção da saúde,
vigilância epidemiológica e combate a endemias em prol das famílias e
comunidades assistidas, dentro dos respectivos territórios de atuação, segundo
as atribuições previstas nesta Lei.”
Verifica-se,
assim, que a União estabeleceu um piso salarial mínimo pelo trabalho em regime
de quarenta horas semanais pelos Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de
Controle de Endemias no valor mensal de R$1.014,00 (mil e quatorze reais).
Importante
ressaltar que a lei não fixa como obrigatória a carga horaria de 40 (quarenta)
horas semanais, porém estabelece que o piso fixado é calculado com este valor.
Desta forma, caso a carga horaria específica de cada município seja diferente,
deve ser calculado o piso horário com a divisão do valor fixado por 200 e multiplicação
pela quantidade de horas mensais. Por exemplo, em regime de 36 horas semanais,
o piso seria de R$912,60, e de R$1.115,40 para 44 horas semanais.
A
fixação de carga horaria constante da lei somente se refere ao calculo do valor
do piso, não importando dizer que a carga horaria de todos os ACS e ACE passou
a ser de 40 horas semanais.
No
entanto, entende-se ainda que toda a jornada de trabalho das categorias deve
ser dedicada a “a ações e serviços de
promoção da saúde, vigilância epidemiológica e combate a endemias em prol das
famílias e comunidades assistidas, dentro dos respectivos territórios de
atuação”.
Discute-se
ainda se o valor do piso salarial iria abranger adicionais acrescidos de acordo
com normas municipais específicas. Ocorre que a lei não é clara sobre o
assunto, porém temos que analisar como paradigma o acórdão da Ação Direta de
Inconstitucionalidade ADI4167 do Supremo Tribunal Federal que entendeu que piso
salarial mencionado na norma referente ao piso nacional dos professores
compreenderia apenas o salario base. Abaixo transcrevo trecho relevante:
“Ementa: CONSTITUCIONAL. FINANCEIRO. PACTO FEDERATIVO E REPARTIÇÃO DE
COMPETÊNCIA. PISO NACIONAL PARA OS PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA. CONCEITO DE
PISO: VENCIMENTO OU REMUNERAÇÃO GLOBAL. RISCOS FINANCEIRO E ORÇAMENTÁRIO.
JORNADA DE TRABALHO: FIXAÇÃO DO TEMPO MÍNIMO PARA DEDICAÇÃO A ATIVIDADES
EXTRACLASSE EM 1/3 DA JORNADA. ARTS. 2º, §§ 1º E 4º, 3º, II E III E 8º, TODOS
DA LEI 11.738/2008. CONSTITUCIONALIDADE. PERDA PARCIAL DE OBJETO. 1. Perda
parcial do objeto desta ação direta de inconstitucionalidade, na medida em que
o cronograma de aplicação escalonada do piso de vencimento dos professores da
educação básica se exauriu (arts. 3º e 8º da Lei 11.738/2008). 2. É
constitucional a norma geral federal que fixou o piso salarial dos professores
do ensino médio com base no vencimento, e não na remuneração global.
Competência da União para dispor sobre normas gerais relativas ao piso de
vencimento dos professores da educação básica, de modo a utilizá-lo como
mecanismo de fomento ao sistema educacional e de valorização profissional, e
não apenas como instrumento de proteção mínima ao trabalhador. 3. É
constitucional a norma geral federal que reserva o percentual mínimo de 1/3 da
carga horária dos docentes da educação básica para dedicação às atividades
extraclasse. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. Perda
de objeto declarada em relação aos arts. 3º e 8º da Lei 11.738/2008. (STF -
ADI: 4167 DF , Relator: Min. JOAQUIM BARBOSA, Data de Julgamento: 27/04/2011,
Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-162 DIVULG 23-08-2011 PUBLIC 24-08-2011
EMENT VOL-02572-01 PP-00035)
A
própria Constituição Federal em seu artigo 198, § 5º, estabeleceu que caberia o
estabelecimento por lei federal do piso salarial dos Agentes Comunitários de
Saúde e Agentes de Controle de Endemias. É importante fazer este registro em
razão de que em decorrência da previsão Constitucional do piso, poderá ser dada
a mesma interpretação adotada pelo Supremo Tribunal Federal com relação ao piso
dos professores, também previstos Constitucionalmente.
No
referido julgado, o STF entendeu que o legislador constituinte estabeleceu
previsão constitucional sobre o tema exatamente em razão da sua relevância,
razão pela qual o piso deveria ser o salário base e não a remuneração, apesar
de comumente ser entendido de forma diversa, pois se configuraria em um
privilégio de importância dada ao professor em razão da necessidade do
desenvolvimento da educação básica, o que também se aplicaria aos ACS e ACE com
relação a necessidade de desenvolvimento da saúde pública.
Trata-se
de uma interpretação que pode e deve ser dada por cada ente municipal até a
manifestação interpretativa judicial de forma contrária, até porque existem
pressupostos diferentes das carreiras apresentadas, inclusive a submissão dos
ACS e ACE à Consolidação das Leis do Trabalho onde não há cargo efetivo criado
em lei pelo município.
Registrando-se,
no entanto, o risco de criação de um passivo sobre eventuais diferenças de
pagamento em decorrência de interpretação judicial futura de forma diversa.
O
artigo que estabeleceu o piso salarial não depende de regulamentação, sendo
auto aplicável, e, portanto, vigente desde a publicação da lei, ou seja, devido
desde 17/06/2014.
Passamos
agora a analisar os demais artigos da lei e para facilitar a compreensão,
efetivaremos comentários em seguida da transcrição de cada trecho da norma.
“Art. 9º-C. Nos termos do § 5o do art. 198 da Constituição Federal, compete à União prestar assistência financeira
complementar aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, para o
cumprimento do piso salarial de que trata o art. 9o-A desta Lei.
§ 1o Para fins do disposto no caput deste
artigo, é o Poder Executivo federal autorizado a fixar em decreto os parâmetros
referentes à quantidade máxima de agentes passível de contratação, em função da
população e das peculiaridades locais, com o auxílio da assistência financeira
complementar da União.
O
caput do artigo 9-C apenas transcreve
o que se encontra previsto na Constituição. O parágrafo primeiro do artigo 9-C
se configura no único item da norma que depende de edição de norma
regulamentadora, ou seja, um decreto que irá fixar o quantitativo de agentes
para cada município em decorrência de sua população e o auxílio financeiro que
será prestado pela União.
§ 2o A quantidade máxima de que
trata o § 1o deste artigo considerará tão somente os agentes
efetivamente registrados no mês anterior à respectiva competência financeira
que se encontrem no estrito desempenho de suas atribuições e submetidos à
jornada de trabalho fixada para a concessão do piso salarial.
§ 3o O valor da assistência
financeira complementar da União é fixado em 95% (noventa e cinco por cento) do
piso salarial de que trata o art. 9o-A desta Lei.
§ 4o A assistência financeira
complementar de que trata o caput deste artigo será devida em 12 (doze)
parcelas consecutivas em cada exercício e 1 (uma) parcela adicional no último
trimestre.
Os
§ 2º, 3º e 4º apenas especificam a forma com que a União irá calcular e pagar a
assistência financeira para o pagamento do piso salarial dos agentes.
§ 5o Até a edição do decreto de que trata o § 1o
deste artigo, aplicar-se-ão as normas vigentes para os repasses de incentivos
financeiros pelo Ministério da Saúde.
O
parágrafo quinto é importante no ponto em que estabelece que enquanto não
elaborado decreto regulamentando o § 1º, do artigo 9-C, as atuais normas
vigentes permanecerão aplicáveis, ou seja, a forma de calculo do quantitativo
de profissionais poderão ser contratados pelos municípios com auxílio
financeiro da União.
§ 6o Para efeito da prestação de assistência financeira
complementar de que trata este artigo, a União exigirá dos gestores locais do
SUS a comprovação do vínculo direto dos Agentes Comunitários de Saúde e dos
Agentes de Combate às Endemias com o respectivo ente federativo, regularmente
formalizado, conforme o regime jurídico que vier a ser adotado na forma do art.
8o desta Lei.”
O
parágrafo sexto apenas estabelece que o Município deverá comprovar que contratou
o agente através das normas da CLT ou de regime jurídico previsto em lei local.
“Art. 9º-D. É criado incentivo financeiro para
fortalecimento de políticas afetas à atuação de agentes comunitários de saúde e
de combate às endemias.
§ 1o Para fins do disposto no caput
deste artigo, é o Poder Executivo federal autorizado a fixar em decreto:
I - parâmetros para concessão do incentivo; e
II - valor mensal do incentivo por ente federativo.
§ 2o Os parâmetros para concessão
do incentivo considerarão, sempre que possível, as peculiaridades do Município.
O artigo 9-D estabelece a criação de um incentivo
financeiro para custeio das politicas de atuação dos agentes de combate as
endemias e dos agentes comunitários de saúde, o que também dependerá de decreto
regulamentador, porém não dispõe de uma norma de transição, não sendo,
portanto, ainda aplicável.
“Art. 9º-E. Atendidas as disposições desta Lei e as
respectivas normas regulamentadoras, os recursos de que tratam os arts. 9o-C
e 9o-D serão repassados pelo Fundo Nacional de Saúde (Funasa) aos
fundos de saúde dos Municípios, Estados e Distrito Federal como transferências
correntes, regulares, automáticas e obrigatórias, nos termos do disposto no art. 3o da Lei no 8.142, de 28 de dezembro de 1990.”
“Art. 9º-F. Para fins de apuração dos limites com
pessoal de que trata a Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000, a assistência financeira complementar obrigatória
prestada pela União e a parcela repassada como incentivo financeiro que venha a
ser utilizada no pagamento de pessoal serão computadas como gasto de pessoal do
ente federativo beneficiado pelas transferências.”
Trata-se
da regulamentação da forma como será efetivada a contabilidade dos incentivos
financeiros repassados e dos gastos de pessoal pagos. Da mesma forma que
estabelece um incremento de receito do ente federado municipal, também fixa o
local em que será inserido o gasto, nos termos já estabelecidos pela Lei de
Responsabilidade Fiscal.
“Art. 9º-G. Os planos de carreira dos Agentes Comunitários de
Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias deverão obedecer às seguintes
diretrizes:
I - remuneração paritária dos Agentes Comunitários
de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias;
II -
definição de metas dos serviços e das equipes;
III
- estabelecimento de critérios de progressão e promoção;
IV -
adoção de modelos e instrumentos de avaliação que atendam à natureza das
atividades, assegurados os seguintes princípios:
a) transparência do processo de avaliação, assegurando-se
ao avaliado o conhecimento sobre todas as etapas do processo e sobre o seu
resultado final;
b)
periodicidade da avaliação;
c) contribuição do servidor para a consecução dos
objetivos do serviço;
d) adequação aos conteúdos ocupacionais e às condições
reais de trabalho, de forma que eventuais condições precárias ou adversas de
trabalho não prejudiquem a avaliação;
e)
direito de recurso às instâncias hierárquicas superiores.”
Trata-se
de artigo em que é estabelecido como deverão ser os planos de carreira dos ACE
e ACS, especificando cada um dos critérios que devem ser levados em
consideração no seu estabelecimento. No entanto, importante registrar que a lei
não obrigou a criação de planos de carreira, apenas estabeleceu as diretrizes
que devem ser observadas quando da sua realização, razão pela qual não se
constitui de obrigação do ente municipal legislar sobre o assunto.
“Art. 16. É vedada a contratação temporária ou terceirizada
de Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate às Endemias, salvo na
hipótese de combate a surtos epidêmicos, na forma da lei aplicável.”
O
artigo 16 foi acrescido à lei para vedar a contratação temporária ou terceirizada
de ACS ou ACE, abrindo como exceção apenas a ocorrência de sustos epidêmicos, o
que deverá ser objeto de declaração e comprovação.
Importante
ressaltar é que ficam vedadas as contratações de cooperativas ou empresas para
executar o serviço diretamente, bem como a contratação de agentes sem o devido
concurso ou processo seletivo simplificados, os quais devem ser distratados de
imediato.
Registra-se
que deve ocorrer concurso público apenas quando há a criação de cargo para a
carreira perante os quadros do município, ocasião em que o agente será servidor
efetivo e estável. Caso contrário, aplica-se o constante do artigo 8º da lei
11.350/2006, quando deverá ser realizado processo seletivo simplificado e a
contratação pelo regime da CLT, sendo o agente servidor efetivo, porém não
estável, podendo ser desligado nas formas já previstas na mencionada norma.
O
presente parecer não esgota o assunto, o qual dependerá ainda das diversas
manifestações judiciais que ainda ocorrerão no futuro, o que poderá modificar
totalmente a situação posta, inclusive com relação ao pagamento do salario base
e a sua caracterização.
São
os termos,
Belém,
17 de julho de 2014.
Napoleão Nicolau da Costa Neto
OAB-PA 14.360
DO AMIGO EDY GOMES!